11.3.24

Fechando livros, trocando por outros

Em 10 anos muitas coisas aconteceram.

Havia fechado esse espaço porque não queria lidar com ele mais, é como se eu tivesse emudecido. Mas criei coragem de investigar um pouco mais a fundo o objeto de estudo que sou eu mesma e percebi que ainda preciso desse diário. Não preciso dele para ser lida por outras pessoas que não são obviamente eu, mas para poder ordenar alguns pensamentos e talvez falar sobre algumas coisas com um terapeuta... o que é um grande avanço sobre minha saúde mental.

É que neste ano decidi buscar o diagnóstico sobre minha neurodivergência... que não sei qual é, mas que claramente sei que possuo.

Não vou prometer nada a mim mesma sobre este espaço, aliás. Este é outro avanço, também.

Estou reativando mais porque parece que fui dobrada, rasgada, dilacerada tantas vezes na vida, com tanta intensidade que isso não parece ser normal, ser um sofrimento de adolescência... de estar se ajustando ao mundo... o fato é que eu nunca consegui me ajustar ao mundo, sempre fui um ponto fora da curva e solitário.

Buscar o atendimento de uma neurologista parece que moveu mais ainda meu universo, que vem sido remexido desde 2018, me obrigando a me readaptar, a ser mais gentil comigo mesma, a entender o quanto é importante saber das minhas limitações para poder lidar melhor com minhas crises.

É isso por enquanto.

Corre pelas veias e salta pelos olhos,
este filete de sangue,
que pulsa e esquenta e transborda e mancha
pelo canto, escorrendo, mesclando com o sal
que brota do esforço.
Sangue e sal, dançando sobre o seio da face,
Como uma bomba imersa num terreno baldio, mas que é frágil e traiçoeiro,
Não pergunte, não ande sobre a mina, ela explode e espalha tudo pelo chão.
O modo mais seguro é seguir beirando, numa estrada paralela, mas atenta,
Se pudesse aninhar a bomba em seus braços, se fosse serena, se fosse segura, sei que era mais fácil,
mas não se engane, que um toque e um leve abraço já te mancham por inteiro com algo que não quer pois que não é seu...
mas a bomba shhhhhh não, nem olhe. Não olhe, não dê confiança, pois que o olhar também toca.
Caminhe pela beirada, apenas.
A metafísica da bomba também é inútil, incompreensível e um complexo interminável, sem referências... mas que tenha algum tipo de afeição,
Saber um naco é experenciar o poder, mesmo que pouco, mesmo que falso... vai que esse saber leva até um caminho seguro de aproximação...
ou de afastamento.
O sal escorre dos poros e marca a trajetória, sossega.
Sossega que o sal conversa com o sangue e o sal dos meus olhos... timidamente,
num papo que não entendemos e que talvez não seja preciso...
mas digo o que é preciso, pois que não sou tão sensível que não caibo segura nos teus braços... e sou sensível que uma palavra fria e dura e longe que sai da tua boca me corta o coração.
E talvez a ajuda existia quando não sabia tanto e achou que não existia... agora a barreira invisível me circunda.
E me tapa e me estapeia.
E a mulher que era forte e protegida numa ogiva tentou furar essa parede, tentou e tentou e o sal a sufocou  o sangue jorrou e a ogiva caiu e a parede ficou.
Ficou.
Talvez seja hora da mulher bomba se despedir e partir pra um buraco no chão ou no céu, com garras ou asas, ou ambos que lhe levem dessa clausura... ela não quer estar ali.
E se o sal lhe for suas garras e asas, que seja forte e a afunde ou que seja fraco e a leve.
A mulher dos meus olhos agora busca escapatória, nua.
Quer um lugar também nu, e olhares nus, e braços nus, e vida nua.
E pensa se agora é o que precisa, daqueles teus braços-ajuda-cruzados e olhos mansos e curiosos sobre algo que está disponível numa fonte... de sal, de sangue e também de doçuras e compreensão,
pois que uma vez negados deixaram uma marca maior que se fossem apertados sobre a lataria da ogiva.

Mas eu... eu tento entender essa mulher desde que a encontrei pairando numa madrugada questionadora e sofrida, numa oração entre os montes novos de sal,
Há anos.
E no dia em que perdi a paciência, no dia em que também coloquei essa mulher de lado e mergulhei nos montes de sal...
nesse dia... eu busquei ajuda.
E tomei um caldo de mandioquinha com suco de limão.
E recebi um abraço forte de alguém que sempre o escondeu de mim.
E sarei um tanto que me fez ir ao trabalho.
E quando eu busquei o conforto de abraços que já conhecia, me foram duramente negados, como se eu precisasse de uma lição de algo que nem sei que é...
e dai, dai eu me escondi encergonhada ate ter coragem de perguntar o que eu havia feito
e perguntei
e não me disseram nada, além  de que me respeitavam
então me acalmei e tentei voltar,
mas...
mas aí, quando olhei nos olhos... não tive resposta...
e aquilo me feriu sem eu ter conseguido me consertar 
e daí não consegui evitar
meu coração se partiu novamente
e tanto
tanto que passaram-se dias e continuo sufocada nos montes de sal... perdida
perdida também da mulher que machuquei ao ser a primeira a deixá-la de lado
a mesma mulher que está presa em algum lugar e tentando sair...
a mulher bomba nua, desprotegida e sentindo tudo em sua pele com tanta força que...
Acho, afinal, que a força pertence a ela... só  a ela, porque eu: fim.

[Estava escrito na sequência do último de 2014, apenas consertei os erros de digitação porque escrevi num rompante de sentimentos... este texto é memória e lembro do que aconteceu... enfim]